NACO DE PROSA

Até breve, Ziraldo

A natureza da saudade é ambígua: associa sentimentos de solidão e tristeza. Garrett definiu a saudade como “delicioso pungir de acerbo espinho”, estava realizando a fusão desses dois aspectos opostos na fórmula feliz de um verso romântico.
Há períodos em nossas vidas em que estamos mais sensíveis à saudade. Palavra que soa tão bela e ao mesmo tempo tão triste quando ouvida, quando sentida.
Saudades da mãe chamando para um café, ou do pai sentado à ponta da mesa nos perguntando: o que terá de almoço no dia seguinte.
Saudade de um cheiro, de um momento, saudade do que foi vivido em sua intensidade.
Pois é, a vida é feita de momentos, que devem ser vividos intensamente, sejam bons ou ruins… os bons entram para o rol da saudade, os ruins nos trazem aprendizado.
Mas, a fase que mais deixa saudade em mim é a infância… das brincadeiras, dos primos, da casa cheia e barulhenta, das tarefas e responsabilidades que, vistas e percebidas hoje, não eram tantas coisas assim.
Saudades de ver minha mãe, na antiga penteadeira entalhada por meu pai, arrumando seus cabelos com spray.
Lembro-me bem do cheiro do spray que ficava ainda um tempo no quarto.
Saudades de andar na famosa brasília do meu pai, ele nos levava para passear, todos tinham a obrigação de ir segurando a porta, pois a cada curva, ela se abria, arrancando risadas de todos. Cada criança ajudava a fazer um horário para seu turno de cuidar da porta. Tudo era festa, mas não havia perigo.
Saudade do som do chimarrão acabando, e minha mãe insistindo em tirar ainda, mais um gole da bomba.
Saudade da TV que tínhamos no armazém, e muitos iam até lá para ver as novidades de perto, a imagem era preta e branca, mas era a melhor de todas.
E como cantava Vinicius “E por falar em saudade”, vem a notícia da partida de Ziraldo. Cartunista, chargista, ilustrador, escritor e um dos grandes nomes da cultura brasileira.
Ziraldo morreu no sábado (6), aos 91 anos.
Foi um ícone dos quadrinhos brasileiros, e o pai do “Menino Maluquinho”, que criou em 1980. Rendeu a ele o Jabuti de literatura infantil e, foi adaptado diversas vezes para o cinema, o teatro e a televisão. Foi amado por gerações de crianças e adultos, pois quem de nós não leu a famosa história criada por ele.
Deixou-nos um legado de muitos livros, charges, foi sempre um grande incentivador da leitura, repetia com frequência que a leitura deve ser um prazer e não um dever.
Dizia constantemente: – “Ler é mais importante do que estudar”. Ziraldo em suas conversas falava: “O Menino Maluquinho é o moleque típico brasileiro, que tem liberdade, é ousado, inteligente, esperto. É o moleque que eu gostaria de ter sido”. Sem dúvida alguma, muitos gostariam de ter sido como “O Menino Maluquinho”.
Jamais imaginei que Ziraldo iria nos deixar fisicamente, parecia ser eterno, por isso, fiquei impactada ao ouvir a nota do falecimento dele.
Sabemos que é um imortal, pois nos deixou obras maravilhosas, as quais farão parte da vida de futuras gerações, assim como fez na nossa. Um ser humano feito de bom humor, alegria, e sorriso largo, multiartista.
Como explicar a saudade que Ziraldo nos deixou?
Não há como explicar em simples palavras a dor da saudade, quem sabe com um enigmático sorriso ao lembrar de nossa infância e juventude mais feliz, entrelaçadas com as vastas obras de Ziraldo, há tanto a contar sobre seu trabalho, e, em meio a tudo, há também os maravilhosos desenhos dos mascotes do futebol do Brasil.
A saudade já está doendo, as lágrimas insistem em chegar. Então, querido Ziraldo:

  • Muito obrigada e até breve!

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