COISAS DA BOLA
ACHA QUE É DE GRAÇA MORAR NO NOSSO CORAÇÃO!
Com a mente inspirada para digitar uns textos, coisa que faço diariamente, fechado no meu pequeno museu-estúdio ouvi o toc, toc, toc do meu netinho Bernardo Getúlio e da netinha Isabela ao baterem na porta de acesso. Dei a autorização para eles adentrarem e perguntei o que eles desejavam, já que eu estava trabalhando, escrevendo crônicas e resenhas sobre o futebol. Tomando a dianteira, olhando bem no meu focinho e com um sorriso malandro, Isabela perguntou se eu poderia lhes dar uma “verbinha” para irem na sorveteria próxima de casa, alegando que o calor estava insuportável. O Bernardo Getúlio, se meteu na prosa e usando como argumento, perguntou se eu achava que era de graça morar no coração deles. Pasmo pelo palavreado dos dois lhes dei trela e iniciamos uma prosa que durou praticamente toda tarde, e o sorvete, a princípio, ficou no esquecimento, quando eles insistiram para eu contar uma das minhas historinhas. É para já, disse eu. E, lá fui rasgando o verbo… no meu conhecido linguajar…
Sentado no seu banco preferido lá fundo do pátio da sua mansão, lendo o jornal semanário de qual era assinante, João Maria teve a sua atenção chamada, quando em frente ao seu portão de grades um fulano desconhecido batia palmas. Trôpego e andando com dificuldades pela idade avançada, levantou-se do banco e foi ter com aquele elemento. Julgando não o conhecer, cumprimentou-o e foi indagando sobre o que ele desejava. Cara a cara, fitando o João Maria de baixo até riba, ele perguntou:
– Você não é o Bananeirinho?
– Quando eu era muito piá me chamavam assim, respondeu o João Maria.
– Eu sou o Empadinha, aquele menino que sentava com você na mesma carteira na sala de aula, quando estudávamos no primário. Continuou o fulano:
– Você foi o piá mais valente que conheci, pois se vingou por nós daquela professora da peste.
Após baterem um pequeno papo no portão, João Maria e Empadinha relembraram algumas passagens das suas infâncias. Logo em seguida o Empadinha foi embora, dizendo que tinha um compromisso médico, mas não sem antes dar a palavra de que se encontrariam para relembrar mais coisas do tempo de piá. Sozinho, em pé diante do portão e se segurando nas grades, pensativo sobre o fato que o Empadinha trouxe à luz, João Maria resolveu voltar novamente para o fundo do pátio e sentar naquele banco, e como uma viagem no tempo, se viu lá no Colégio Balduíno Cardoso e lembrou-se em detalhes daquele ato grotesco cometido por ele. E, como se estivesse consultando com uma psicóloga, relembrou aquele acontecimento para tentar uma superação, porque percebeu que aquilo até nos seus dias de velhice o martirizava. Lembrou tudo nitidamente. Tudo aconteceu assim…
A prova estava sendo aplicada. A criançada toda estava concentrada em um silêncio quase taciturno para responder as questões, cujas notas seriam registradas no boletim de cada um. João Maria e seu amigo Empadinha dividiam a mesma carteira, bem como, o mesmo pote de tinteiro, onde sempre devia estar armazenada a tinta que usariam em suas canetas à pena. Naquele dia de prova o João Maria era responsável por levar a tinta para municiar o dito tinteiro. Não levou, pois, o seu tinteiro fora mau fechado e a tinta derramou toda dentro da sua pequena mala surrada pelo uso, que acondicionava os cadernos. Foi uma sujeira só.
Logo no início da prova acabou a tinta da sua caneta e, nos seus dez anos de idade começou a tremer. Com baita medo daquela professora megera, se debruçou sobre a folha da prova e começou a pensar o que fazer. Criou coragem e levantou uma das mãos, falando que tinha acabado a tinta da sua caneta, porque por descuido ele tinha virado o seu tinteiro dentro da mala dos cadernos. Ouviu como sempre uma resposta seca e ríspida, porque era nesse tom que ela se dirigia aos alunos filhos de pais proletários. Disse ela: – Te vira! Para os dois coleguinhas – o filho do prefeito e a menina filha de um causídico, o tratamento era totalmente ao contrário dos demais. Era aveludado. Ela sempre tecia elogios deixando sempre bem claro de como os dois eram inteligentes e, certamente, teriam futuros auspiciosos, iguais aos seus pais. Com mais medo ainda, João Maria debruçou-se sobre a carteira e ficou quietinho. Quando tocou a sineta avisando que tinha acabado a aula, junto com os demais alunos e alunas ele entregou a sua prova só que sem responder nenhuma questão, e foi embora. Na aula seguinte todos receberam o boletim e na sua nota, escancarada estava um “zerão” escrito com tinta vermelha. O medo começou a tomar conta de João Maria, pois com certeza o pau ia cantar lá em sua casa quando seus pais vissem aquela nota. Tentando fugir do cambuí no lombo, escondeu o boletim atrás do guarda-roupas do seu quarto, e frequentemente como justificativa dizia para sua mãe, que somente receberiam o boletim no final do ano.
Estava chegando ao final o ano letivo quando sua mãe resolveu fazer uma faxina geral no seu pequeno quarto, e descobriu, jogado atrás do seu guarda-roupas o boletim com o “zerão em vermelho”. Na conversa de pé de orelha que tiveram, pela primeira vez ele teve coragem e contou tintim por tintim do que aconteceu e acontecia dentro da sala de aula. Talvez o seu relato naquela hora foi o que abrandaria a ira de sua mãe na infração que ele cometeria no último dia de aula.
Precisando tirar a nota dez para compensar aquele zero, na prova final, para ser aprovado e ganhar o direito de fazer o exame de admissão para cursar as séries do ginasial, fiscalizado pela sua mãe, João Maria foi obrigado a estudar toda a lição dada durante o ano. Aos trancos e barrancos ele conseguiu tirar a nota necessária para aprovação, e aquele esforço, foi o que lhe deu conhecimentos e o ajudou na aprovação do exame de admissão ao ginásio.
Era o último dia de aulas do primário, liberados do uso do uniforme todos poderiam ir com qualquer vestimenta, mas ele foi com o “guarda-pozinho” de sempre. Premeditadamente, João Maria foi usando na cabeça um pequeno chapéu de feltro preto e, em virtude disso, os seus amiguinhos de classe começaram a lhe chamar de “chapéu de catar ovo”, inclusive a mestra, que demonstrava muita satisfação em fazer gozação com ele, mas não imaginava ela, que o que era dela estava guardado.
Após ouvirem o som da sineta avisando o final do tempo do recreio, todos adentraram para as salas de aula. João Maria não. Sozinho, postado ao lado dos mastros das bandeiras, levantou o guarda-pó, abaixou a calça curta, e de cócoras, fez um “número dois” meio avantajado e o cobriu com o chapéu de feltro. Saiu correndo dali e foi até a sua sala de aula, abriu a porta e antes que levasse o tradicional pito da professora, foi falando em som alto: – Peguei… peguei… peguei com o meu chapéu! – Pegou o que criatura? Disse a professora. – Um passarinho que nunca vi igual, respondeu João Maria. Antes de terminar de falar foi uma corrimaça de crianças atrás dele. Todos em volta daquele chapéu de feltro preto para ver o passarinho. Fazendo uma encenação para que ninguém tocasse no chapéu, pois o passarinho poderia fugir, não deixou ninguém ficar muito próximo. Nisso chegou a professora, e em um tom imperativo disse que ela pegaria o passarinho. Extasiado com tudo aquilo, João Maria ainda teve a iniciativa de dizer para ela colocar a mão e pegar rápido, porque senão ele poderia fugir. Como que ouvindo o seu conselho, ela se ajoelhou, colocou a mão rapidamente e apertou. Aquela imagem até hoje é muito nítida na mente de João Maria e, talvez, seja um dos poucos arrependimentos do que ele tenha feito durante a sua vida, não sabendo de onde tirou coragem para aquele ato. Ao ver aquela fuzarca das crianças, a diretora se aproximou e percebendo a sacanagem, fez com que todos os alunos se dirigissem para a sala de aula, para que não vissem a professora retirar a mão com o “passarinho” amassado entre os dedos.
De joelhos e virado de frente para uma parede, usando aquele chapéu de feltro preto afundado na cabeça, até o final da aula, foi o seu castigo. Ao chegar em casa seu pai lhe esperava no portão, e de cara, percebeu as marcas vermelhas nos seus joelhos. João Maria disse para o pai que era em virtude de jogar de goleiro após a aula. Embora o seu pai soubesse que ele era bom de bola jogando na linha e não de goleiro, ficou por isso, mas o importante era que João Maria tinha passado de ano e aquela professora não teria mais contato com ele, e os desaforos dela não iriam mais para a casa de João Maria.
OBS: O texto faz parte do novo livro do Craque Kiko, que será publicado futuramente.
COISAS DA BOLA são fatos vividos por mim, histórias contadas por amigos e outras frutos da minha imaginação. Qualquer semelhança será puro acaso.
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COISAS DA BOLA
Mais uma de galo de briga
Do escritor da periferia – Craque Kiko.
Acadêmico da ALVI – Academia de Letras do Vale do Iguaçu.
Texto do livro prestes a ser lançado – Causos da vida de fato.
Um fulano de posses. Ele perambulava entre a elite e proletariado, mas entre a classe menos abastada é que se sentia à vontade.Amigo do peito dos amigos, sociável e de uma humildade a toda prova. Sempre que lhe solicitada uma ajuda, o fazia com gosto. Era muito conhecido em toda a região. Visto com um baita futuro político. Diziam, seria um prefeito, um deputado ou até um político nas mais altas esferas, por que não!Adorava uma caçada, tinha cães bem treinados. Corrida de cavalos, então, o fazia vibrar. Agora, em um rinhadeiro, seus galos de briga eram dos bons, muitos troféus faziam parte de sua galeria. Isso é um pouco do que era o Ivan. E, é sobre ele e briga de galo essa narrativa.
O povo entupia aquela rinha. Aquele ar enfastiado de catinga dos penosos, enfumaçado pelos paieiros feitos com fumo em corda, era conhecido daquela gente, que saído da raia de cavalos, ali do ladinho, já com muitas biritas pela cachola, vinha terminar aquele domingo assistindo a enorme e esperada peleja entre o invicto e famoso galo Branco, do Ivan. O oponente era um não menos famoso galo, também sem ter nunca conhecido um revés, da localidade conhecida como Três Barras, cidade vizinha da capital da erva-mate, Canoinhas.
Já ia para duas horas a luta, pau a pau. Era uma briga de gigantes, mas o galo visitante, tinhoso e técnico, até parecia que teve aulas, esporeava e dava bicadas certeiras. O galo Branco, após um pialocerteiro estava com um olho cegado, mas ainda peleava de igual para igual, até que, não deu mais para ele. Um contragolpe do visitante fez vazar a outra vista. Aí, foi uma verdadeira saraivada de golpes, mas resistia, e nas escuras tentava revidar. Seus golpes iam ao vazio, não achavam o seu algoz. Perto de três horas de uma verdadeira tunda, mas sempre em pé, valente, sangrando muito e só com a “capa da gaita”, o galo Brancotodo estoporado não atirava os panos. Não fazia parte da sua natureza se entregar. Então, o Ivan, com seu coração gemendo de pena, vendo tamanha judiaria, jogou a toalha e assumiu a derrota do galo Branco.
Zenóbio, um senhorzinho, amante inveterado de prélios galináceos, que não perdia de vista nenhuma contenda naquela rinha, pediu para si aquelegalo Branco, que na visão de todos por ali, tinha adquirido a aposentadoria por invalidez. Foi presenteado com o galo, e ouviu com tristeza do Ivan – faça um bom ensopado. Mas, Zenóbio, que pela experiência de vida, muitas vezes enxergava além muros, tinha outros planos para aquele galo. Vira nele uma raça fora do comum, pois aguentar em pé quase três horas de peleja, totalmente cego e levando pialo a briga toda, não merecia ir para a panela.
Antibióticos, banhos mornos, pomadas nas feridas, massagens com catinga de mulata e muito rango bem vitaminado, passou a ser o dia a dia daquele galo. Em três meses, com cegueira total, estava recuperado da sumanta levada no seu último combate. Foi fechado a sós em um pequeno galinheiro com uma galinha forte ebotadeira, que se achava a rainha da cocada preta. Fez valer o seu instinto de macho. Com a galinha tremendo e arrepiada, a cruza foi inevitável. No primeiro e único ovo daquela galinha periguete, deu o ar da graça neste mundo, um pintinho totalmente com penugens de uma brancura total, que a cada dia se via, saíra o focinho do papai.
O pinto cresceu e virou um galo porrudo. Zenóbio com seu vasto conhecimento o pôs em treinamento puxado. Vira naquele galo um futuro promissor, que poderia lhe dar muita mufunfa, mas não era só esse o seu interesse. Por intermédio de um telegrama enviado na Estação Ferroviária União, atou uma briga em altas cifras com aquele famoso galo de Três Barras, que ainda seguia invicto dando troféus e dinheiro para o seu dono.
Mais uma vez o rinhadeiro estava apinhado. Pulgas por ali se sentiriam espremidas. Tinha gente de todos os cantos e tocas das beiradas do Rio Iguaçu. Era a última briga daquele domingo. Mesmo sem terem visto o galo do Zenóbio, as apostas eram vinte e quatro contra um, favorável ao galo visitante, invicto e famoso. Como se fosse um prélio futebolístico alguém deu um apito para começar a renhida luta. Não foi renhida. Em poucas passadas, com golpes certeiros que pareciam igual a jogadas ensaiadas, o galão tresbarrensebeijou a lona e ficou estrebuchando. Era como se fosse uma vingança que estava engasgada, aquele galo vingara o galo pai.Zenóbio forrou a burra de tantas cédulas.
Abismado pela valentia daquele galo, Ivan quis saber de onde ele surgira. Zenóbioentão, contou toda a história, tintim por tintim e lhe deu de presente, pois aquele penoso era filho do cego galo que ele lhe dera para fazer um ensopado.
Naquela segunda-feira, ao viajar para o litoral para dar cuidados a uma de suas empresas, viajando tranquilo, Ivan teve o seu bilhete de passagem vencido, era a hora do seu desembarque. Do nada, uma encosta desmoronou e caiu sobre o seu auto. Ele desencarnou, e deste chão terreno, sob o comando de Zenóbio, não pode ver as glórias daquele galo, que passara a ser chamado de “Campeão”, do Ivan.
COISAS DA BOLA
Da inocência para o mundo cão
Ele tinha 17 anos, ela 16. Sempre que ele saía do treino, em frente da casa ela o esperava passar. Do outro lado da rua ele sorria, mas tinha receio de puxar uma prosa. Ela, espivetada, cansou de só ficar olhando. Puxou papo:
– Está com medo de mim?
Tímido. Criando coragem não sabe de onde, ele se achegou e proseou:
– Sim, tenho medo – nunca conversei com uma moça do teu naipe.
Pegou a mão direita dela, e com delicadeza beijou. Ela vermelhou toda. Ele sentiu ela tremer. Ela deu um beijo na bochecha dele. Emocionado, ele tremeu na base. E, foi desse jeito, que ataram um namoro.
Todo dia após o treino do esquadrão profissional, ela estava na frente de casa esperando por ele. Suspirava ansiosa quando ele demorava. Ele não via a hora de estar com ela. Ocultos por detrás do portão roubavam beijos. Os arroubos da juventude afloravam. A libido dele ia para a copa dos paus. Ela se umedecia nas partes íntimas.
Já não aguentavam aqueles encontros furtivos atrás do portão. Começaram a se encontrar num paiolzinho nos fundos da casa dela. O pai não queria de jeito nenhum que ela namorasse. Ela era nova de tudo. Namorar com um boleiro, jamais. O pai sempre estava de botuca, mas era logrado. Quando ia trabalhar, o namorico deles pegava fogo naquele paiol, mas não iam além de umas poucas bulinações.
O prélio pelo paranaense seria em Bandeirantes, contra o União. Na famosa Vila Maria. Viajando durante nove horas, ele matava a saudade ouvindo as músicas românticas nas fitas cassete que ela lhe emprestara junto com o seu gravador. Nessa viagem ele atinara. Estava perdidamente apaixonado. Na volta, ficaria nas barbas com o “sogro” e pediria para namorar de forma oficial. Se ele não deixasse, roubaria a filha.
A volta era muito esperada. Venceram o cotejo por um a zero. Ele fez o tento bimbando uma falta. Mais nove horas de viagem. Noite toda. Ele muito feliz e com saudades dela. O consolo foi ouvir as músicas românticas. Seis horas da manhã aportaram na Sede do esquadrão. Ele dormiu no colchão sobre um beliche até meio dia. De banho tomado, roupa nos trinques, recendendo desodorante Avanço, do lado do alojamentobombiava e esperava que o pai dela fosse trabalhar. Enfim! Ele foi. Na correria foi até lá. Pela primeira vez ela lhe abriu a porta da casa. Ele entrou afoitamente. Entre beijos e abraços, passou uma rasteira e ela se estirou ao chão. Ajeitou o couro no terreno e se preparou para atirar forte. Em cima dela. Beijos, beijos e mais beijos. Ele, ávido, rasgou aquela blusinha fina, retirou o sutiã e com a cabeça entre aqueles enormes seios, ora em um, ora em outro, chegou a revirar os olhos de tanto sugar.
Desconfiado, naquele dia, o pai fez que foi e, não foi trabalhar. Dando uma de “Migué”, lá na esquina ficou na espreita. Para sua própria desgraça armou um flagra. O que veria, nunca imaginou, talvez um futuro genro, “bezerrão”. Irado, enquanto correu para apanhar o machado lá no paiolzinho, o ex-futuro genro escafedeu-se, ouvindo que era um piá de bosta com os dias contados.
O caminho deixou de ser pela frente da casa dela. Recebeu de volta todas as cartas perfumadas escritas para ela. Junto na bolsa, veio um bilhete alertando-o. A par do flagrante, o irmão dela, um louco varrido, junto com um bando iriam canchá-lo de pau. Que se cuidasse. Ele se armou. Começou a andar berrado. Dando uma desculpa esfarrapada, emprestara de um amigo polícia um 38 de marca Schmidt. Andava com aquele caga-fogo escondido na parte detrás da cintura.
Armados de porretes, o bando lhe cercou. Quando foram lhe atacar, fez aquele trabuco cuspir fogo. Criou um rebuliço. Foi uma correria daquela turma. Nunca mais o importunaram. Mas, perdera de vez a namorada. Com muitas saudades, para conter o sofrimento, dentro da sua patente, vivia fazendo dedicação para ela usando os “cinco contra um”, imaginando estar sugando as suas enormes e duras tetas.
Sabedor que ela estava de mira com um grã-fino, com um calorão na testa começou a frequentar um balcão. Um amigo de paleta vendo a sua sofrência, convidou-o para ir junto em um casamento. Após emprestar um paletó, de peru, apareceu na festa do casório. Viu uma moça a fitá-lo. Com uns goles a mais, ele virou um poeta. Encantou-a e se encantou com ela. Ali, acabara de conhecer um grande amor da sua vida, não para todo o sempre, pois o para sempre não existe, um dia vira fumaça.
COISAS DA BOLA
A difícil peleia para se aposentar
Do escritor da periferia – Craque Kiko.
Perícia daqui e perícia de lá. Ele estava sendo julgado insano. Era mais um encostado pela previdência social. Voltar a trabalhar estava fora dos seus planos, nem a “pau juvenal”. Queria ser aposentado a qualquer custo.
A nova perícia estava próxima. Um dia antes, ele tomava uns goles de pinga misturada com pólvora. Juntos nessa mistura, dois comprimidos para dormir. Seu corpo começava a demonstrar que estava com algum mal. Seu coração parece que ia sair do peito. Tremeliques e palavras desconexas. Já fora da casinha, novamente ele circulava pelado pelo pátio do prédio. Imaginando ter nas mãos uma “maquina” de procurar ouro, afirmava que o fundo da fossa estava repleto dele. Aos gritos e plantando bananeira com o fiofó virado para a lua, ele via novamente a ambulância chegar para atendê-lo.
Famoso pelo ato, já era conhecido dos enfermeiros. Obedecia-os, e dentro da Van seguiam para a UPA dando risadas. Cara a cara com o médico de plantão, armava um banzé. Um sossega leão na veia levava-o ao sono tranquilizante. Um internamento era inevitável. Após dias, medicado, recebia alta hospitalar. A sua pretendida aposentadoria por invalidez, imaginava, caminhava a passos largos. Logo, logo pintaria. Voltar para o trampo, nem por misericórdia. Mas, eis, que, como um aborto da natureza, a sua cura apareceu do nada quando foi enviado para um sanatório.
Em uma noite, um dos plantonistas daquela casa para loucos não aguentando a fuzarca armada pelo pretendente à aposentadoria, resolveu ir para forra. Enquanto o interno dormia anestesiado o sono dos loucos, socou-lhe papel higiênico na boca e nos dois ouvidos. Também, com o interno deitado e amarrado na cama com a "busanfa" para cima, o enfermeiro tirou-lhe as pregas. Deflorou-o e gostou do ato. Toda noite o fato se repetia, mesmo com o interno acordado. Indefeso, só lhe restava chorar em silêncio. Algumas vezes reclamava, só que ninguém acreditava em suas palavras. Não aguentando mais aquelas sevícias, o louco de araque começou a se comportar. Melhorou do dia para a noite. Logo ganhou alta. Voltou a trabalhar no seu serviço público, mas lhe doía o botuqueiro quando entregava cartas sentado no selim de uma bicicleta.
Depois de anos, a sua tão esperada aposentadoria veio, não por invalidez, mas por tempo de serviço. Infelizmente ficara com sequelas - um de seus ouvidos ficou surdo e o seu fiote estava alargado. Só de imaginar em ouvir a palavra sanatório, ficava pianinho, e se escondia embaixo da cama. Quando encontrava aquele enfermeiro do sanatório, que virara seu vizinho de porta, suas vistas transbordavam em lágrimas.
Uma tarde para não se esquecer
Do escritor da periferia – Craque Kiko.
Um frio do capeta. Lá fora o vento ainda fraco, mas longe de ser somente uma brisa, balançava os pequenos galhos das duas pequenas palmeiras nos extremos do meu pequeno jardim retangular. O Sol há dias tinha deixado de nos visitar. Eu, parado frente da janela do meu museu-estúdio, olhava lá para fora querendo entender porque o Dom Bilu não parava de latir no grande portão. Naquela hora, ele deveria estar ninando dentro da sua casinha, lá nos fundos da garagem. De onde eu estava, só conseguia visualizar a metade do portão. Querendo descobrir o porquê da tamanha latição, colocando o chapéu, sai pela porta dos fundos e marquei presença junto dele na frente do dito portão. Descobri o motivo, e esquecendo o dia cinzento, frio e neblinoso, abri um enorme sorriso.
O motivo era justo e merecia aquele ganiçar, desde que fosse uma declaração de amor ou um elogio para ela. A cadelinha era linda, igual a sua dona que a segurava por uma pequena corda. A dona da, quem sabe futura namorada do Dom Bilu, foi-se dali levando a cachorrinha. Dom Bilu se acalmou, saiu na correria até a garagem lá no fundo do pátio e voltou trazendo na boca, aquele pedaço de dinossauro de borracha já meio esgaceado. Entendi de cara o que ele desejava. Então, jogando aquele toco de dinossauro da frente do portão até os fundos do pátio, cerca de 35 metros, iniciamos o preparo físico dele. Eu arremessava o pedaço daquele réptil, ele saía na correria, apanhava e trazia até mim. E, assim, após vinte arremessos, com ele já colocando a língua de fora, encerramos os trabalhos.
Para me recuperar, já sentado no banco do pergolado lá no fundo do quintal, enquanto eu bebia um café na xícara do Vasco, o Dom Bilu sentado ao meu lado, salgava o peito com uma iguaria feita pela minha esposa. A cada gole daquele café quente e gostoso, encarando o cãozinho, que também me encarava após uma dentada ou outra naquela perna de galinha, nós dirigíamos o nosso olhar lá para o portão da frente. O Dom Bilu na ânsia que aquela cachorrinha retornasse, e eu, esperando uma caminhonete de lenha picada, que recém tinha encomendado.
