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BREVES HISTÓRIAS

Um pouco antes das discotecas

Em minha crônica anterior falei um pouquinho dos primeiros DJs das cidades e de como eu e Nivaldo Camargo idealizamos o Alucinasom, no caminho de casa após o Baile dos Jogos da Primavera. Mas ainda demoraria alguns meses para o nascimento do Alucinasom.
Em maio de 1975, eu era namorado de Sônia Carneiro e como tal fui convidado para o aniversário de 15 anos de Mara Marés, no então Núcleo Social Odete Conti. Mara estudava com Sônia e isso propiciou não apenas meu convite, como o de Nivaldo, Rubio Savi, Edson Mendes e Vilmar Bughay. Eu ainda pediria a aniversariante mais quatro convites, para meus amigos Paulo e Zinho Murara e dois amigos deles que tinham vindo de Canoinhas.
Quem tocou na festa de Mara foi o Curtisom de Juba Millis. Como já mencionei na crônica anterior, o equipamento do Curtisom era bem bacana, mas o repertório era pequeno.
Foi naquela noite que, efetivamente, decidimos que iríamos criar uma equipe de som para tocar em festas. E assim foi.
Nossa estréia foi em agosto daquele ano no Clube Concórdia, na festa de 15 anos de Bernadete Bona.
Aqui abro um parêntese para agradecer os amigos que lêem minhas crônicas e as comentam no Facebook.
Minha amiga Leonice Espanhol, oportunamente, lembra das festas que tocávamos no salão do Núcleo Social, mencionando que foi lá que ela conheceu nossa turma da Barão do Cerro Azul e também era lá que seu pai a deixava ir com a irmã, minha querida e eterna amiga, Malu Longhi.
Foi lá que tocamos ainda no segundo semestre daquele, para nós mitológico ano, as festas de Sueli Carneiro, que acho que foi em outubro e de Mara Terezinha da Cruz, creio que em novembro, época que ela já namorava com Nivaldo.
Em novembro ou dezembro tocamos uma festa na AABB. Se bem me lembro, não era festa de aniversário e sim uma promoção da diretoria do clube. Não lembro porque, mas nessa festa fomos apenas eu e Nivaldo, acompanhados de nossas namoradas, que já então com 15 anos, foram, devidamente, autorizadas pelos pais para nos acompanhar.
O equipamento nós levamos à tarde, com o carro de tia Lulu ou do tio René e de noite íamos a pé até o Bairro São Bernardo, buscar Sônia e Mara e de lá para a AABB. Era um longo trajeto, mas não nos importávamos. Ficamos quase a noite toda na cabine de som e já no finalzinho da festa, com apenas alguns casais dançando, fui dançar com Sônia. Nivaldo sabia que eu gostava muito de We all fall in love sometimes, de Elton John, soltou essa bolacha e dançamos a mesma música por nove vezes consecutivas. Voltamos para cabine e eu disse a Nivaldo que agora era a sua vez de dançar. Mandei a mesma canção e Nivaldo e Mara também a dançaram por nove vezes.
Quando eles voltaram, mandamos Esse tempo não é mais o mesmo, de O Terço e que usávamos para encerrar as festas, uma vez que a letra da música dizia em certo momento, volte na próxima semana.
Meu caro amigo James Pucci lembrou da festa de um ano de Alucinasom que aconteceu junto com a festa surpresa de minha amiga e colega, Neusa Rosa, de bancos escolares do Colégio São José, no Círculo Militar, em 27 de agosto de 1976. Fui surpreendido por James, que publicou o convite no Facebook. Eu imaginava que apenas eu ainda tinha guardado essa preciosidade. Obrigado James, formidável sua publicação.
Tocamos muitas festas, mas uma das mais emblemáticas que lembro foi a festa surpresa para Zilnéia Lima, prima de meu dileto amigo, Gilberto Lima e por via de conseqüência de Joathan César de Souza, o Quingo. Essa festa recebeu essa aura emblemática, porque foi nela que toquei pela primeira vez Nuvem passageira, de Hermes Aquino. Eu fui a Curitiba comprar novos discos para a festa e entre esses trouxe o compacto de Hermes Aquino, que tinha em seu lado B, Matchu Pitchu.
Ainda lembro que na manhã do sábado em que a festa seria realizada, fui a casa de minha grande amiga Desiré Costa para mostrar o que eu havia trazido para tocar a noite. Nessa época nossa turma de amigos tinha em seu cast feminino além de Desiré, Neusinha Rosa, Gleice Wengerkiewicz, Eliziane Wengerkiewicz, Vivian Koerner e Tereza Ruski, que eu começaria a namorar um pouco depois, mas sendo nessa festa com Nuvem passageira, que começaríamos a nos aproximar, ultrapassando os limites de uma bela amizade que mantínhamos.
É isso, são muitas histórias tendo a música como pano de fundo e o Alucinasom como protagonista.

Estilhaços de memória

Escrevo essas mal traçadas linhas, ouvindo um cover de Harvest Moon, do lendário Neil Young, na voz de um grupo intitulado F & F. Recomendo. Belíssima interpretação da clássica e antológica canção de Young, o que me remete a dezembro de 2019, quando eu e Nina Rosa fomos a Califórnia visitar Mayara e Bradley.
Num sábado frio e chuvoso, após percorrermos o Farmers Market, fomos almoçar em uma clássica hamburgeria e ao lá chegarmos, o que estava tocando era Harvest Moon, claro que em sua versão original.
Na segunda semana de San Francisco eu e Nina recebemos de presente de Natal de Mayara e Braddley, um passeio de dois dias pela Rota do Vinho, visitando as principais vinícolas de Sonoma e Napa. O pai de Bradley, Charlie Dunn, uma figura espetacular foi junto, ou melhor, nós é que fomos com ele, já que o carro era seu e também foi ele quem nos presenteou com a estadia em um aprazível e bucólico hotel, além de não nos deixar pagar uma única refeição. Mayara e Bradley por sua vez além de nos presentearem com os ingressos nas vinícolas, ainda nos presentearam com várias garrafas do excelente vinho californiano. Foram momentos fantásticos, em pequenas e aconchegantes cidades da Califórnia ao som de excelente música.
Mas conto tudo isso para narrar que a trilha sonora da viagem foi, especialmente, preparada por Charlie, que em nosso quarto ou quinto encontro, já conhecia meu gosto musical. Ouvimos Crosby, Stills & Nash, Beach Boys, Cat Stevens, Buffalo Springfield, Elton John entre tantos outros.
Da Califórnia de dezembro de 2019, salto para os dias atuais, nos quais costumo caminhar ao entardecer, por ruas vizinhas de minha Barão do Cerro Azul.
Num desses fins de tarde, após descer pela 1º de Maio e retornar pela Castro Alves, ao me aproximar da Praça Coronel Amazonas, irrompe em meu Spotify, a canção By the time I get to Phoenix, de Bobby Goldsboro. A canção faz parte de seu belo álbum Honey, de 1968. Diante da linda canção, sou compelido a me sentar em um banco daquela praça e ouço a música por umas três vezes, assistindo as últimas luzes do entardecer ceder lugar às primeiras luzes artificiais que iluminam o cair da noite.
Agora enquanto escrevo, ouço por seguidas vezes a canção acima mencionada e Summer, também de Bobby Golsboro, mas de seu disco homônimo de 1973.
Quando me levanto para ir embora, o Spotify toca You´re a lady, emblemática canção de 1972, de Peter Skellern e que minha querida tia Lulu gostava muito e sempre pedia para eu tocar. Permaneci sentado ouvindo a canção e dedicando-a a tia Lulu.
Fim da canção. Me levanto e o Spotify, que parecia querer homenagear tia Lulu, manda And I love you so, também com Goldsboro e que, também era uma das preferidas de tia Lulu.
Permaneço sentado e lembrando com muita saudade de minha querida tia.
A música termina e volto para casa ouvindo mais uma vez By the time…com a cabeça repleta de boas lembranças.

21 de maio de 2021 – Delbrai Augusto Sá

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BREVES HISTÓRIAS

Não se vencem eleições na véspera

Como nos aproximamos de mais um pleito municipal, lembrei das eleições de União da Vitória em 1988.
Nesse aludido ano fui um dos coordenadores da campanha de meu amigo Gilberto Brittes à Prefeitura Municipal e também atuei na coordenação da campanha para vereador de outro dileto amigo, Mário Patruni.

Gilberto Brittes acabou derrotado por Mário Riesemberg, enquanto Mário Patruni foi eleito vereador pelo PTB, com 396 votos. O PTB também elegeu nesse ano Hussein Bakri e Décio Pacheco.
A bem sucedida campanha de Mário Patruni foi ancorada, primeiramente, no excelente trabalho que ele fazia na direção da empresa Ivo Kerber, propiciando que ela apresentasse sensível crescimento naquele período. O que também contribuiu muito para a eleição de Mário, foi sua notável performance como dirigente esportivo. Mário montou um verdadeiro esquadrão de futebol de salão na empresa Ivo Kerber, que foi campeã paranaense dos Jogos do SESI.
Naquele período, mais ou menos em 86 ou 87, Mário foi candidato à presidência do Clube Aliança, enfrentando a poderosa chapa da situação, encabeçada por Olaf Sohn, sucessor de Antônio Swierk, cujo grupo, há muitos anos dirigia o Clube. Foi uma eleição muito acirrada e Mário perdeu por pequena margem de votos.
Cabe aqui ressaltar que a profícua atuação de Mário como vereador, fez com que ele quase triplicasse sua votação nas eleições de 1992, quando ele chegou próximo dos 800 votos.
Acompanhei de perto a atuação de Mário como vereador e dessa forma ainda lembro de alguns de seus projetos, que foram transformados em importantes Leis, como Vereador por um dia, Disque Câmara e a Fila especial nos bancos para idosos, gestantes e portadores de deficiência.
Mas o título desse breve relato prende-se ao fato de que terminada a apuração dos votos, que era realizada no Ginásio de Esportes Isael Pastuch, com os votos ainda impressos, Mário acabou não sendo eleito, apenas se elegendo pelo PTB, Hussein Bakri, o mais votado daquele pleito, com mais de 1000 votos e Décio Pacheco, com 800 votos.
O candidato Airton Maltauro Filho, que se não me engano, concorreu pelo PDS acabou eleito com essa legenda, ultrapassando o quociente eleitoral, por apenas alguns votos.
Saímos do Ginásio já desolados com a derrota de Gilberto Brittes e ainda mais cabisbaixos com a não eleição de Mário. Como eu era um razoável conhecedor da fórmula pela qual se calcula o quociente eleitoral, assim como o quociente partidário e de posse da votação nominal de todos os candidatos e dos votos atribuídos apenas às legendas, ao chegar em casa resolvi refazer os cálculos e eis que após vários recálculos, observei que o partido pelo qual Maltauro Filho havia concorrido, na verdade não atingira votos suficientes, ficando abaixo do quociente eleitoral.
Fui imediatamente à casa de Mário, com os cálculos nas mãos e disse que precisávamos interpor, imediatamente, um recurso solicitando a recontagem de votos, especificamente, do partido pelo qual concorrera Maltauro Filho.
Fomos até o Distrito de São Cristóvão, onde residia, Wilson da Silva, então presidente do PTB. Expliquei a situação e solicitei papel timbrado do partido, já assinado em branco, para que eu escrevesse o recurso. Fomos para minha casa, escrevi o recurso e levamos em mãos para Walter Ressel, então Juiz eleitoral.
Os votos foram recontados e de fato o partido de Maltauro não havia atingido o número de votos suficientes para a configuração do quociente eleitoral.
Portanto, Maltauro, que já comemorava a vitória no Barril 2001, não foi eleito, sendo eleito Mário Cesar Patruni.
Finalizo voltando ao título desse breve texto, afirmando com todas as letras, que eleição não se vence na véspera e, às vezes, nem no próprio dia.
E ainda existem negacionistas da extrema direita que advogam a volta do voto impresso.
Com o voto digital isso jamais teria acontecido.

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BREVES HISTÓRIAS

O que teria sido de nós?

Li recentemente o livro, A fábrica de cretinos digitais, de autoria do sociólogo francês, Michel Desmurget.
Nas mais de 400 páginas o autor discorre sobre os malefícios do abuso da Internet, principalmente, em crianças e adolescentes. Desmurget comprova, por meio de pesquisas, que pela primeira em várias décadas, essa geração tem um QI menor que o de seus pais.
Nessa mesma premissa, vou começar a ler nos próximos dias, A geração ansiosa – Como a infância hiperconectada está causando uma epidemia de transtornos mentais, de autoria Jonathan Haidt.
O autor vai na mesma toada de Desmurget e analisa o, suposto, colapso mental da juventude e sugere medidas para uma infância mais saudável e livre de telas.
Embora o assunto seja instigante e perturbador, não me acho abalizado para discuti-lo por aqui, deixando-o ao encargo de minha amiga e também colunista de Caiçara, Maris Stela Stelmachuk, doutora em Psicologia e com anos de experiência.
Dessa forma, meus caríssimos e poucos, mas fiéis leitores, devem estar se perguntando porque abordei o assunto.
Posso explicar. A leitura do primeiro livro aqui mencionado, assim como de artigos e mesmo filmes sobre o assunto, me remeteu a minha adolescência, ou mais especificamente, a meus longínquos 15 anos, quando já disse por aqui, comecei a abandonar a bola de futebol, substituindo-a pelas primeiras paixões juvenis.
Como também já contei aqui nas páginas de Caiçara, minha primeira paixão juvenil foi por uma menina de nome Maristela. Como não tenho autorização dela, por que nunca falei com ela em toda minha vida, embora ela seja moradora de União da Vitória, omito seu sobrenome.
Ela como eu estudava no Túlio de França, acho que uma série depois de mim, embora fosse dois anos mais nova do que eu.
Volto a contar que tanto nos recreios das aulas, como na saída do colégio, nos olhávamos, mutuamente, mas nada de conversarmos. Acho que isso durou alguns meses. Como também já contei por aqui, certo dia, após o término das aulas, eu e Nivaldo Camargo, meu inseparável amigo, subíamos a Manoel Ribas, andando uns 20 metros atrás de Maristela e de Débora, sua também inseparável amiga, de repente elas se viraram e vieram em nossa direção. Apavorados entramos em uma loja, evitando assim o encontro. Não tenho certeza, pois aí já se vão mais de 50 anos, mas acho que foi aí que nosso caso nunca começado, tenha acabado.
Logo depois disso, ou talvez antes disso, eu Nivaldo e Paulo Murara, outro grande amigo, começamos a nos interessar por Rosa, uma linda garotinha que morava próxima de nós. Nenhum dos três teve a coragem de falar com ela, até que, em algum momento de 1973, ela se mudou da cidade.
Logo depois disso, já em 1974, eu ficava fascinado com a garotinha da bicicleta verde, que dava voltas e mais voltas em sua quadra e passava por mim, cada vez mais magnetizado por sua beleza e leveza. Para mim ela não andava em sua bicicleta, mas voava. Era Rossandra Monteiro da Cunha, hoje Codagnone e hoje minha amiga e que me autorizou a declinar seu nome.
Meu primeiro contato, com minha primeira namorada, Sônia Carneiro, foi por meio de um ex-vizinho e então vizinho dela e depois por bilhetes e até por um walkie talkie que eu e meu amigo Edson Mendes, compramos em sociedade. Com o precário alcance do aparelho e como eu já morava aqui na Barão do Cerro Azul e ela no Bairro São Bernardo, deixei o meu rádio com ela, enquanto eu falava com ela da casa de Edson, que era seu vizinho.
Meu querido leitor/leitora ainda deve estar se perguntando o que isso tem a ver com a Internet, que abordo no início dessas mal traçadas linhas?
Tem tudo a ver, ou melhor, como eu teria agido se naquela época, já houvesse telefone celular e redes sociais.
Será que protegido pela distância física eu teria tido coragem de falar com Maristela, Rosa e Rossandra, pelo Whats App ou Facebook?
Boa pergunta, mas impossível de responder. Mas lembrando de como eu era, acho que continuaria sem coragem para um primeiro contato. Acho, por outro lado, que enviaria músicas, esperando receber um sinal qualquer para depois efetivar o contato.
Com Sônia já teria sido diferente, e eu já do alto de meus 16 anos, e muito menos introvertido, teria trocado os radiotransmissores e os indefectíveis bilhetes pelo Whats App.
E você caro leitor/leitora, o que teria feito em situação semelhante a minha?
Até a próxima.

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BREVES HISTÓRIAS

Sutil e delicado

Neste ano de 2024, consegui assistir a todos os filmes concorrentes ao Oscar de melhor filme. Comecei assistindo Oppenheimer. Gosto bastante do trabalho de Christopher Nolan. Gostei do filme, embora o tenha achado convencional demais. Depois assisti Barbie. Apreciei a mensagem de empoderamento das mulheres, mas achei o filme, demasiadamente, juvenil. Já Assassinos da lua das flores, comecei a assistir duas vezes e acabei desistindo. Vou dar mais uma chance, mas confesso que ainda não fui seduzido pela história, embora a saiba pungente e revoltante.
Do diretor Bradley Cooper, eu havia assistido em 2018, Nasce uma estrela e agora com Maestro, que conta a vida de Leonard Bernstein, mas dá pouca importância à sua obra. Erro imperdoável.
Gostei muito de Anatomia de uma queda. Palma de Ouro em Cannes em 2023 e Oscar de melhor roteiro original. Assim como gostei de Os rejeitados, de Alexander Payne. Sou um fã incondicional de Paul Giamatti. Eu torcia por ele na categoria de melhor ator.
Também gostei muito de Ficção americana, cujo surpreendente roteiro adaptado valeu ao filme o Oscar nessa categoria
Mas vamos agora aos meus favoritos. O segundo melhor filme, para mim, foi Pobres criaturas, do grego, Yorgos Lanthimos e que foi o vencedor na categoria de melhor atriz, para Emma Stone, com atuação digna de antologia. O filme ainda levou os Oscars de Direção de Arte, Figurino e cabelo e maquiagem. Todos justíssimos. Pobres criaturas é um filme fantástico que inicia como um épico cômico e vai, gradualmente, evoluindo para uma crítica à supressão da liberdade, os bolsonaristas e os hipócritas conservadores não vão gostar e tampouco entender. Mas o filme segue avançando para uma crítica social da desigualdade e como se não bastasse ainda é, extremamente, feminista, recolocando gradualmente a mulher em seu lugar de destaque. Simplesmente genial.
Mas antes de abordar meu filme favorito, não posso deixar de mencionar o inquietante, denso e candente, Zona de interesse, Oscar de melhor filme internacional
Zona de interesse é um dos melhores filmes sobre o nazismo e expressa com todas as letras, ou melhor com imagens e sons, aquilo que Hanna Arendt chamou de a banalidade do mal. Imperdível.
Vamos então não apenas ao melhor dos concorrentes ao Oscar, como para mim, o melhor filme de 2023, e não apenas isso, um dos melhores filmes dos últimos anos.
Falo sim de Vidas passadas de Celine Song, que se inspirou em sua própria vida de imigrante para compor sua belíssima obra. Vidas passadas, é o filme de estreia da sul coreana, que além de diretora é também a roteirista do filme, que começa com uma cena em um bar onde três pessoas, dois homens e uma mulher conversam.
Aí há um corte e a cena retrocede 24 anos, quando um menino e uma menina caminham conversando. Com maestria, leveza e delicadeza Song vai desvelando a história.
Em certo momento da narrativa a personagem da mãe da protagonista, magnificamente vivida por Greta Lee, diz, em cada escolha que fazemos, ganhamos alguma coisa, mas irremediavelmente, perdemos outra.
O filme fala das escolhas que fazemos e de suas consequências, da reverberação de um primeiro amor, para alguns facilmente esquecido e para outros, como o casal de personagens, ao contrário, reverberando ao longo de suas vidas.
Doze anos após a partida da protagonista, primeiramente, com seus pais para o Canadá e depois para os EUA, eles se reencontram por uma rede social e aquele passado nunca esquecido é revisitado.
Em determinado momento da trama Nora decide interromper o contato com Hae Sung, temendo que o envolvimento deles atrapalhe sua carreira. Logo em seguida, em uma residência artística ela conhece Arthur, personagem interpretado pelo também excelente, John Magaro. Eles namoram e acabam antecipando o casamento para que ela obtenha o green card.
Mais doze anos se passam e o casal se reencontra em Nova Iorque, daí em diante o filme ganha ainda mais em densidade e sutileza, com a câmera os acompanhando de longe e quase sempre com os dois enquadrados em planos separados, denotando com isso a impossibilidade de um relacionamento, mesmo havendo uma profunda conexão entre eles. O distanciamento não é apenas geográfico e como na bela canção de Ivan Lins e Vitor Martins, Lembra de mim, ” perto daqui, mas tarde demais”. O tempo passou eles trilharam outros caminhos e mesmo conectados, parece que não há mais tempo para uma reaproximação, pelo menos nesta vida.
Ao fazermos nossas escolhas, lá na frente não será mais possível saber se elas foram as certas ou não, pois não podemos voltar no tempo e alterá-las.
A cena final, primeiro no restaurante quando o casal conversa em coreano, com o marido de Nora ouvindo, não entendendo e não interferindo, é magnífica e depois, enquanto Hae espera um Uber é de uma beleza poucas vezes vista no cinema.
A música de Stevie Wonder, All in loves fair, nos diz que no amor tudo é possível, nem sempre é assim, pois algumas de nossas decisões e escolhas podem ser irrevogáveis. O tempo terá passado e dificilmente, ou quase nunca, seremos os mesmos, embora certas lembranças nos acompanhem por toda vida.
Vidas passadas não é apenas imperdível, é memorável e é dessas lembranças que nos acompanham eternamente.

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